2 de outubro de 2015

HIPPIE DE CORAÇÃO PAULISTANO QUER RODAR O BRASIL

Por Vinícius Vieira, Nicolly Soares e Kaique Dalapola

Em meio à correria e insegurança da multidão no centro de São Paulo, na saída da estação República do Metrô (uma das mais movimentadas do estado) está a hippie Rebeca Delgado, 33 anos, vendendo seus artesanatos com a calma e pacificidade da ideologia hippie, a qual a encanta desde os 17 anos, quando começou viajar para vender artesanatos e conhecer outros hippies.

Rebeca Delgado trabalhando na República (Foto: Kaique Dalapola)
Apesar da ideologia hippie ter nascido na cidade São Francisco, Estados Unidos, na década de 1960, pregando o amor livre, Rebeca diz que é "contra o amor livre, e a favor de que todos se respeitem, tanto no modo de se vestir como no modo de se comportar”.

A hippie, que na adolescência teve curtas experiências como garçonete e operadora de telemarketing, afirma que hoje se sente mais feliz em sua presente profissão, na qual trabalha ao ar livre e é dona do próprio negócio: “O que eu gosto mesmo é de fazer artesanato”. E mesmo não tendo completado o ofício de garçonete, Rebeca, em seu novo ramo, tem contato direto com público e faz um bom atendimento. Enquanto dois jovens olhavam para os produtos vendidos e fabricados por ela, a mesma, com sorriso no rosto e voz doce, orientou os clientes dizendo que podiam “ficar a vontade" para olhar os produtos expostos na calçada. Quando finalmente foi questionada sobre o valor de um anel, ela respondeu com o mesmo tom amigável: “Esse está sete reais cada um, bora levar?”.

O valor de venda das suas peças vai de R$ 5,00 a R$ 300,00. Entre os objetos vendidos estão anéis de coco, pulseiras, colares, cintos e bolsas. “Em casa produzo a maioria, mas tudo que faço em casa posso produzir na rua”, explica. Com um inseparável carrinho, Rebeca carrega todo o material necessário para a fabricação de seus artesanatos e, orgulhosamente, diz: “Aqui tem tudo que eu utilizo: fio de cobre, couro, linha, cola, fivelas, capicheira, martelo e bigorna. Essa mochila [apontando para a pesada e surrada bolsa preta] pesa mais de 30 quilos”.

Com esse trabalho no centro de São Paulo, a sua renda mensal, segundo ela, chega em torno de R$ 1.000,00. Entretanto, há determinadas mudanças: “Varia muito de acordo com as vendas, posso tirar em um dia de trabalho 500 reais”. Com o dinheiro ela sustenta a filha, paga o aluguel e compra materiais para produzir mais artesanatos.

A família de Rebeca hoje se resume a citada filha que, ao contrário da mãe, abomina a cultura hippie e já tem um grande sonho em mente: “Ela quer estudar, quer ser estilista”. E ao marido, o qual amigou, chamado Adriano, que trabalha diariamente ao lado de sua barraca.

Diversos artesão ganham a vida no centro de São Paulo
(Foto: Kaique Dalapola)
Rebeca, que concluiu o ensino médio através do supletivo, e hoje ganha a vida vendendo trabalho artesanal, reconhece as inúmeras dificuldades encontradas ao trabalhar na rua. Uma das principais reclamações é a falta de informação da própria polícia, que frequentemente tenta apreender suas artes, considerando-as como produtos piratas, contudo, a Lei nº 15.776 de 2013 regulamenta o trabalho, permitindo que os hippies produzam e vendam os artesanatos.


Ao ser questionada se considera uma pessoa apolítica, ela é bem taxativa: “não me relaciono muito com a política. Procuro sempre estar por dentro de todos os assuntos, sei de todos os descasos, se precisar fazer alguma manifestação até compartilho da ideia”. Porém, as diferentes convicções políticas de cada integrante do movimento hippie faz com que o tema não seja prioridade entre eles.

O corpo coberto por tatuagens revela as raízes, os gostos musicais e até mesmo a crença da jovem hippie, que contraria a própria essência do movimento. “Eu não tenho nenhuma religião, mas acredito muito em Deus e na força da natureza que vem de Deus também”.

Apesar de ser paulistana, desde os 17 anos viaja por todo país, em busca de levar o trabalho às cidades. Ela afirma que voltou para São Paulo somente por questões financeiras, mas pretende voltar para São Tomé das Letras, pequena cidade de Minas Gerais onde morou durante os últimos sete anos. “Quero sugar tudo de bom que São Paulo tem e também fazer minha parte. Mas quero um dia, sim, morar em alguma cidade menor ou interior”.

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INDICAÇÃO E SUMIÇO

Este perfil foi feito em abril deste ano para desenvolvimento de Projeto Integrado da FAPSP (Faculdade de Comunicação), no qual teria que apresentar o perfil de um "trabalhador invisível do centro de São Paulo". Em setembro, o texto foi indicado ao prêmio de melhor Projeto Integrado da Faculdade, concorrendo com outros dois projetos. A premiação acontecerá na sexta-feira (09/10), fechando a Semana de Comunicação da FAPSP.

Depois de ter finalizado o texto, fomos novamente atrás de Rebeca, entretanto, a hippie não voltou mais à Praça da República. Provavelmente continua sua vida ambulante, sendo feliz por outras terras, sem sequer saber que estamos falando dela pela internet. Tampouco que um pedaço do cotidiano dela está concorrendo a um prêmio de melhor texto-perfil.

Não sei por onde anda essa hippie super atenciosa, mas se um dia ver ou ficar sabendo desta postagem, fica aqui nosso muito obrigado e boa sorte!

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